[Tem vestígio, não tem travessão]



Vinha caindo a tarde. Era um poente não de agosto, mas de março. Aquela tarde mansa deixou o vento entrar pela casa, fazer barulhos e ocupar minha sala cheia de papéis pelo chão. Reorganizo-os e volto a dedicar-me. O relógio tic-tac-eia e já são nove da noite. Jhonatas me liga, e não está bêbado. Tornou-se abstêmio, inclusive. Você precisa voltar, ele diz. Não tenho mais tanta beleza, Jhon. Você sabe... A fadiga da rotina, as obrigações acadêmicas, os pedaços que a vida vai me tirando... Não tenho mais. Volte! Volte logo! Pegue aquele caderno que te dei e que tu nunca preencheu e comece de novo. Não sei... Elas virão, menina. E você não pode parar, precisa que elas voltem pra não ficar igual a esses zumbis. Seja astronauta, mulher! Rimos.
Ele sabe do meu desejo de pisar na lua, ele sabe daquele livro que comecei num cemitério e parei na página 50. Também sabe daquele outro que comecei de um sonho que tive e parei na primeira página. Me falou sobre seus dias, lhe falei de parte dos meus, mas nem concluo, pois o desgraçado volta a insistir... Nossa eterna monotemática: escreva! 
Jhon, Jhon... Se tu soubesse... Se tu ao menos pudesse ver meu olhos agora... Eles têm um quê de brilho, mas tem muito mais de realidade... Não quero saber, precisa voltar. É, não fazem mais amores como o nosso, com toda calmaria, com toda agonia, a dor e a delícia que é dizer exatamente o que se sente, ou escrever... Me mande cartas, pra me inspirar! O tempo anda difícil para os sonhadores, ando ouvindo muito aquela canção... Que saudade. Que saudade! Taí, escreva sobre isso. Às 00h57min, apanhei um dos papéis do meio da sala e escrevi, em letras de fôrma pra fazer alusão ao tamanho real: “AI, QUE SAUDADE!”




                                                                                   09/06/2015 Karinne Costa

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