ALMA CANINA

Aquele cão que me fitava sem piscar, correspondendo ao meu questionamento ocular, não precisou de mais do que alguns poucos segundos para eliminar de vez a minha dúvida. Rapidamente desviou seu olhar para dentro da padaria. E foi isto que me bastou para ter a certeza de que o amor existe. Pelo menos entre os cães e os seres humanos, precisamente nesta direção.

Ele fora deixado ali, acorrentado ao fino e frio poste de metal por alguns minutos, enquanto seu dono, um jovem de pouco cavanhaque, comprava alguma coisa no estabelecimento. Aproveitei para desafiá-lo com um olhar direto: Me prove que o amor existe!

Com os olhos tristonhos fixos nos meus, em pouco tempo voltamos ao início deste texto.

Um detalhe caracteristicamente masculino fez aquele cão esquecer seu dono por alguns instantes. Uma cadelinha branca de rabo ventilante quis encostar seu narizinho gelado ao dele: "Muito prazer!"

Mas estamos falando de amor. Em pouco tempo o cão estaria novamente com seu olhar fixo para dentro da padaria. Elogiei a raça. Queria ter alma canina.

Mais do que isso! Queria que todo ser humano tivesse alma canina. Amor, fidelidade, talvez alguma coisa para conter essa ansiedade… Um psicólogo, pílulas... Ou talvez essa ansiedade seja necessária para sustentar tamanho amor. Enfim…

Tive grata surpresa quando o cavanhaque voltou, limpou os olhos do cão com um guardanapo úmido e, em meus pensamentos, carinhosamente perguntou: Demorei, meu amor?

Angelo Asson 17/02/2015